terça-feira, 4 de julho de 2023

Zum-trinta-e-um














Tantas vezes eu já falei, né
da cor dos teus olhos, desse mel
bem docinho,
tal qual tu todinha
das tuas lindas pintas
pintam tudo em cor-de-amor

Repetir-se seria uô
sempre mais do mesmo

Te digo:
se bom marinheiro sou,
é porque sou feito nesse annapaulístico mar
é pelas águas do teu corpo
em que me banho por inteiro
é bonito o balançar
agora calmo, depois bravo-aventureiro
depois calmo de novo
depois bravo-assustador
o mar é assim
tu é assim
a vida é assim
e tu é vida

Estamos aqui, mesmo, é pra navegar
à luz do sol e do luar
desbravando
disfrutando

Mas falemos aqui
aqui-li
quili and the quili
de como estar na tua vida é presente
presente-passado-futuro, também
mas é um presente te ver de perto
a pessoa - das melhores desse universo, de tudo
teu coração é gigante
bondades mil ante
esse mundo
que nem te merece
- preces -
pra que tu mantenha sempre tua essência
transcendência
do bem
puro, materializado
felizardo
eu, que te sinto de perto
ouço teu respirar à noite
deixando minha mão passear pelas tuas costas
até tu adormecer por completo
serenidade no semblante
aqui dentro, nada pode te fazer mal, meu amor
não enquanto eu te protejo com mão-na-costa
é disso que eu gosto:
de quando tu gosta!

E sigo no discurso:
estar ao teu lado nessa vida é como uma trilha
muito verde - a natureza é muito tri
silêncio e sons lindos em uníssono
beleza no percurso
dificuldade moderada
tu no cipó
quiproquó:
aqui não importa
onde vamos chegar
importa, sim,
nosso caminhar
participar do teu viver
é mergulhar de olhos abertos na vida
e em todo esse zum-zum-zum
minha parceirinha: parabéns
pelos trinta e um.

sexta-feira, 4 de março de 2022

Vivo

- Pode estacionar ali atrás. - Quanto é? - Quize reais a hora. 

Saí caminhando, sentindo o ar tocar mais ou menos um terço da cara, onde a máscara descartável, os óculos e a cabeleira o deixavam chegar. É estranho, eu nem gosto muito daquela avenida. Na verdade, quase sempre que passo por ali, faço o mesmo comentário: da Andradas pra lá, eu amo, queria morar lá, mas essa parte aqui, até o Camelódromo, odeio. Tudo. A rua, a calçada, o cheiro, os olhares de caras fechadas, o cheiro de novo. Mas ia dizendo que mesmo assim, peguei aquele ar na cara e gostei. Me senti vivo, era vida por todo lado, me atingindo nas canelas, nas mãos, nos cabelos, eu respirava fundo por de trás daquelas três camadas recomendadas pela OMS e aproveitava cada segundo. Tanto tempo depois, caminhar ali me deu esse gosto estranho de vida, de sair da toca e ver o mundo lá fora, essas coisas. Caminhei poucos metros, sempre atento, olhando em volta, notando tudo ao redor, inclusive percebi que as traiçoeiras calçadas não golfaram aquela sopa putrefatal de outros tempos. Isso era uma coisa que me incomodava: caminhar rápido por ali, pisar numa lajota solta e pá - meu Allstar amora encharcado daquele caldo que juntava sujeira, mijo, água da chuva, água escoada nas limpezas das calçadas das frentes de lojas e lancherias - podrera. Mas não dessa vez. Não chovera nos últimos dias, estava tudo seco. E ainda tinha uma brisa agradável. Sucesso! As paradas estavam cheias e as frutas e legumes estavam lá, nas mesmas bancas de sempre. Adentrei o mercado. Como de praxe, deu vontade de comer peixe, mas nem parei na parte das peixarias. Outra hora! Encontrei a morena, tudo já estava meio que fechando, mas ainda deu tempo de renovar o estoque de erva pro chimarrão - três tipos diferentes, meio quilo de cada. Não consegui comprar o café, tudo bem, fica pra próxima. Ainda daria tempo de passar por cima do viaduto e ver o céu todo cor de laranja se deitando por cima do Guaíba - espetáculo que sempre encanta, não importa quantas vezes se veja. Nos metros de volta, mais algumas lajotas soltas na calçada que carinhosamente não derramaram nada sobre meus pés e mais vida entrando em contato com minha pele, mais mil pessoas por segundo cruzando pra lá e pra cá. 

- Opa. Quanto ficou, então? - Deu dez reais. 


sexta-feira, 5 de março de 2021

12.03.19

Levanta 
pula
entoa teu mantra 
lê tua bula 
e me deixa 
ser cura 
teu lampião
na noite escura 
dá tua mão 
que agora 
é de acreditar 
não solto mais 
pode navegar 
serei teu cais 
levanta 
olha no espelho
canta, encanta 
balança os cabelos 
esse colorido 
de sabores 
arco-irrindo 
de amores 
o céu nosso 
de sol, chuva e ar 
que é onde posso 
a vida, sonhar.

quinta-feira, 26 de março de 2020

Fresta

No fim nem te falei 
que ontem pela manhã 
eu te fresteei 
pelos seis ou sete centímetros 
da porta entreaberta 
do nosso quarto 
fiquei ali parado 
um tempinho só 
são tantos anos
e às vezes 
ainda me pego encantado 
pela pintura crua 
do teu rosto 
dormindo 
tuas pernas nuas 
o aposto 
de um quadro lindo 
que eu posso contemplar 
dia a dia 
noite a noite 
e tu tem tantas facetas 
anjo guria mulher 
do riso do choro do gozo 
é um repouso 
da vida lá fora 
poder estar aqui 
te vendo dormir 
te vendo acordar 
descabelada me faz sorrir 
e eu sei que tá um caos 
o mundo, a vida 
talvez até teu peito 
o coração 
em furacão 
mas eu quero estar ali 
no frestear da porta 
te olhando 
ou ao teu lado na cama 
ou embaixo de ti 
te tendo 
ou massageando 
tuas costas, tua alma 
só quero estar 
ali.


quarta-feira, 25 de março de 2020

Caos e cores pela janela

Café roncando
reverberando
nos cantos
nas teias
rompendo o silêncio
dessa vista alheia
janela indiscreta
prédios brancos
trancos e barrancos
abertura repleta
de céu azul
cru e nu
são cores frias
me pergunto
quantas vidas vazias
(sobre)vivem
nesses quatrocentos nichos
mil e duzentos bichos
encarcerados
longe da sociedade
longe da insanidade
de um homem imundo
líder de loucuras
que em meio ao caótico mundo
nos afasta da cura
antibióticos
não nos livram
dessas vez
não nos privam
da embriaguez
de dias atípicos
de novos medos
de um tom apocalíptico
nesse sinistro enredo
de incógnitas
de não saber
quem vai estar
aqui ou ali
aí ou acolá
no próximo mês
no próximo ano
exibindo uma viva tez
no mano a mano
com a vida 
nas ruas
nos abraços
cada um na sua
mas em entrelaço
e eu me pergunto
nos tantos metros
que me separam
aqui nessa mesa amarela
bebendo um café preto
da próxima torre branca
quanto desse ar
que não vejo
que já não encontra beijos
não nos leva aos entes
e nos torna tão ausentes,
é transportador do caos
é o pandêmico hospedeiro
nos fazendo prisioneiros
do nosso próprio mal?
tem um fio de luz
cortando o céu
é o fio da navalha
no qual estamos vivendo
é a vala
comum
é o boom
do momento
é um tento
mostrando que nada vai bem
não tem freio esse trem
mas ainda pode descarrilhar
pode piorar.
-
Acabo de ver uma toalha
ou um tapete, um pano
um engano
não sei
é vermelha
pendurada no quinto andar
do outro bloco
fez a paleta de cores quebrar
aqueceu o gélido visual
mas enfeiou
ou tentou
me mostrar que um contraste pode, ainda, acontecer
enquanto isso sigo
com ela
comigo
aqui dentro
esperando a vida voltar.

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Reescrita



Tu falava
hoje cedo
da nossa reescrita
desejos e medos
de como passaram
voando
e em negrito
as páginas desse ano
ano bonito
ano corrido
teve peso
teve vontade
(re)descobertas
novos planos
as cobertas
encostando
no chão
a umidade
a unidade
de nós dois
em combustão
aquecendo
as noites do agora
e não demora
a estar na folha anterior
pois aqui a gente escreve
dia a dia
segundo a segundo
e não prescreve
essa história
e cada olhar
é uma nova vitória
e em cada suspiro
a gente renasce
não é um papiro
numa garrafa
jogada ao mar
não estamos à deriva
é um eco
de tudo que fomos
gritando "viva"
dizendo "vão em frente"
"enfrentem"
é um lindo jogo
de palavras que vi
na parede preta
manuscrito por ti
e que eu interpreto
pra hoje
pra amanhã
e ah...
a cada manhã
quando saio do breu
das poucas horas de sono
no aconchego teu
te vejo ali
e renovo o encantamento
desse novo tento
já pego a caneta
e o nosso caderno
e começo
a produção textual do dia
e não meço
o tamanho
dos versos
eu barganho
teus gestos
teu riso
em bilhetes
são post-its
colados
na página que vem
em seguida
colorida
das mesmas cores
que tu me fez ver outrora
em outra estrofe
em outro capítulo
o que eu quero
é seguir
contigo escrevendo
a quatro mãos
mais sins do que nãos
e ir vivendo
nos permitindo
gozar a vida
é descabido
mas acho lindo
o jeito que a gente se toca
quando teu amor sai da toca
e tu vive o nós
e eu te vivo
e nós vivemos
o tu e o eu
e a reescrita
segue o curso
natural da vida
da nossa existência
e reticências...


terça-feira, 26 de março de 2019

Toelho

Vazio 
o maior que já senti 
dos que vi por aí 
(cala)frio 
moça 
olha só o que eu te escrevi 
enquanto lavava a louça 
eu meio que morri 
lembrando de tudo 
desse mundo 
que era só nosso 
e por mim ruiu 
desmoronou 
uma dose de Moscow 
servida em barril 
te daria agora 
e beberia outra 
seria pouco 
não deixaria ir embora 
tu 
meu par
verdadeiro nu 
da minha'lma 
vem cá 
senta ao meu lado 
lá na grama 
aqui na cama 
acalma 
esse tanto
do nosso pranto 
que em um dia 
já chorei litros 
lágrimas arredias 
em gritos 
silenciosos 
aqui dentro 
do peito 
do apartamento 
deu eco no quarto 
(isso aqui é uma caixa) 
a cada faixa 
de todo o Quatro 
que atentamente 
escutei 
e cantei 
como se fosse a gente 
pelas ruas 
errando caminhos 
fazendo um ninho 
mirando a lua 
volta, amor 
quero esquentar teus pés 
esquecer os egos 
e fazer o encaixe 
das peças de lego 
que dormem grudadas 
às vezes quebradas 
mas ali 
bem juntinhas 
tentando montar 
algo maior 
assim, um lar
mesmo depois 
de dois 
ou três ou dez
pedaços
desmontados 
perdidos 
destruídos
e achados 
reconstituídos
nos percalços 
das idas e vindas 
dessa nossa vida.