sábado, 20 de agosto de 2016

Sexta-feira

Ao passo que a esperança,
nessas andanças,
aos poucos se esvai,
o coração vai pesando,
a voz embargando,
cada vez mais.
Cada vez mais,
a gente procura refúgio,
numa carapaça,
algo que proteja.
Dentro das canecas,
alguma cachaça,
qualquer imersão que seja.
Quando menos se espera,
um mergulho no rio gelado,
enquanto na janela a cidade passa,
e no borrão nem árvore se vê.
Algo a falar, sempre se tem,
mas soa dolorido,
quando a cinquenta por cento de preto
está todo o colorido,
da caixa de lápis de cor,
da caixa de giz de cera,
das roupas bonitas,
do brilho dos olhos
cor de mel do avatar.
A tristeza é sacana,
vai pelas beiradas,
espreme os olhos e, na marra,
tenta deles tirar água,
essa mesma que alagou a rua,
que está nas poças,
que amanhã vai evaporar,
e que ainda da janela eu vejo ser
vital,
tão igual,
tão diferente,
e que mata a gente.
O grito preso na garganta,
o silêncio solto no espaço,
o vácuo,
sem saber como proceder,
o fim do texto,
do riso,
do fim de semana,
da epopeia do Odisseu,
da semana inteira,
da falta de esperança,
nessas andanças,
de uma molhada,
e frustrada,
sexta-feira.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

No osso

A manta encobre
a marca no pescoço
e eu aguento, no osso
o que pode ser
sem ninguém saber
só mais um dia ruim.
A fotografia ideal
na voz muda do oxigênio
ora por aparelhos
ora por gemidos
tão esbaforidos
que se olham no espelho
ou na lanterna vermelha
da tela do telefone celular
que molha e sua
e seca e fica
grudado por dias
como um sopro quieto
que causa alvoroço
mas eu aguento, no osso.